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Mostrando postagens de fevereiro, 2018

Soneto de Agosto

Tu me levaste, eu fui... Na treva, ousados Amamos, vagamente surpreendidos Pelo ardor com que estávamos unidos Nós que andávamos sempre separados. Espantei-me, confesso-te, dos brados Com que enchi teus patéticos ouvidos E achei rude o calor dos teus gemidos Eu que sempre os julgara desolados. Só assim arrancara a linha inútil Da tua eterna túnica inconsútil... E para a glória do teu ser mais franco Quisera que te vissem como eu via Depois, à luz da lâmpada macia O púbis negro sobre o corpo branco. Vinicius de Moraes

Buscando a Cristo

A vós correndo vou, braços sagrados, Nessa cruz sacrossanta descobertos, Que, para receber-me, estais abertos, E, por não castigar-me, estais cravados. A vós, divinos olhos, eclipsados De tanto sangue e lágrimas cobertos, Pois, para perdoar-me, estais despertos, E, por não condenar-me, estais fechados. A vós, pregados pés, por não deixar-me, A vós, sangue vertido, para ungir-me, A vós, cabeça baixa, pra chamar-me. A vós, lado patente, quero unir-me, A vós, cravos preciosos, quero atar-me, Para ficar unido, atado e firme. Gregório de Matos

Poema de uma quarta feira de cinzas

Entre a turba grosseira e fútil Um pierrot doloroso passa. Veste-o uma túnica inconsútil feita de sonho e de desgraça… o seu delírio manso agrupa atrás dele os maus e os basbaques. Este o indigita, este outro apupa… indiferente a tais ataques, Nublaba a vista em pranto inútil, Dolorosamente ele passa. veste-o uma túnica inconsútil, Feita de sonho e de desgraça… Manuel Bandeira

Prefácio

Assim é que elas foram feitas (todas as coisas) — sem nome. Depois é que veio a harpa e a fêmea em pé. Insetos errados de cor caíam no mar. A voz se estendeu na direção da boca. Caranguejos apertavam mangues. Vendo que havia na terra Dependimentos demais E tarefas muitas — Os homens começaram a roer unhas. Ficou certo pois não Que as moscas iriam iluminar O silêncio das coisas anônimas. Porém, vendo o Homem Que as moscas não davam conta de iluminar o Silêncio das coisas anônimas — Passaram essa tarefa para os poetas. Manoel de Barros

Soneto de fidelidade

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De tudo, ao meu amor serei atento Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto Que mesmo em face do maior encanto Dele se encante mais meu pensamento. Quero vivê-lo em cada vão momento E em louvor hei de espalhar meu canto E rir meu riso e derramar meu pranto Ao seu pesar ou seu contentamento. E assim, quando mais tarde me procure Quem sabe a morte, angústia de quem vive Quem sabe a solidão, fim de quem ama Eu possa me dizer do amor (que tive): Que não seja imortal, posto que é chama Mas que seja infinito enquanto dure. Vinicius de Moraes

Fevereiro

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Fevereiro Escute só. Isto é muito serio. Ande, escute que isto é sério. O mundo está tremendamente esquisito. Há dez anos atrás o Li** disse que existe uma rachadura em tudo e que é assim que a luz entra não sei se entendi. (…) O amor é um animal tão mutante, com tantas divisões possíveis… Lembra daqueles termómetros que usávamos na boca quando éramos pequenininhos? lembra da queda deles no chão? então, acho que o amor quando aparece é em tudo semelhante à forma física do mercúrio no mundo quando o vidro do termómetro se quebra, o elemento químico se espalha, e então ele fica se dividindo pelos salões de todas as festas mercúrio se multiplicando… acho que deve ser isso uma das cinco mil explicações possíveis para o amor. Ah, é.. Eu gosto de você… A luz entrou torta por nós adentro, Mas olhe.. Eu gosto de você.. (…) Hoje ainda faz bastante frio. (…) A esta hora na Terra é metade Carnaval, metade conspiração, metade medo, metade fé, metade folia, metade desespero, E provavelmente, a